NÃO SUFOQUE O SEU CHAMADO



Por Laryssa Ribeiro


A forma como cada um vai até Deus e decide servi-lo são as mais diversas, alguns vão buscando o conforto por ter sofrido uma perda, outros por não terem encontrado significado pra sua existência em outros lugares, há ainda quem se entregue a Ele após ser convencido da sua existência e amor pela humanidade. Isso porque Deus, por saber que somos diversos (porque Ele nos criou assim), adota também formas diversas de atrair nossos corações pra Ele, de acordo com os nossos anseios, necessidades, medos etc.

Mas o fato é que independente da forma que somos atraídos, o fruto que isso produz é o mesmo: um chamado. Isso mesmo, um chamado. No dia que recebemos a salvação juntamente com ela recebemos um chamado. Isso porque não faria sentido de acordo com a visão bíblica de Reino que fossemos salvos apenas para viver a eternidade com Deus, e somente isso. Na verdade, para além disso, a Bíblia sempre nos induz a um plano maior, a um Reino cujo Deus nos deu o privilégio de fazer parte dele. Essa visão de Reino nunca é individualista, elas nos fala de trabalho em conjunto, de suportar o próximo e viver em comunidade e em amor. A forma que cooperaremos para a difusão desse Reino é o que denomina-se chamado.

Esse chamado que dá sentido àquilo que antes não tinha, dá forma de sonho ao que antes era apenas desejo. As experiências vividas, as marcas deixadas, as perdas sofridas, ganham um significado. O que antes era acaso, destino, sorte, agora é parte de um propósito. É parte de um sonho sonhado só pra você, de uma história escrita por Deus, de uma missão, um chamado. Esse chamado não é claro no início, mas ele se apresenta na forma de um desejo profundo e urgente de “retribuir” a graça recebida, de cooperar como Reino. Isto é, queremos amar como fomos amados, curar porque fomos curados, perdoar porque primeiro fomos perdoados etc. A Bíblia nos conta brevemente no capítulo 4, versículos 38 e 39 do evangelho de Lucas, a história da cura da sogra de Pedro. Essa mulher, após ser curada por Jesus, levanta-se imediatamente e passa a servir os que estavam ali presentes. Sua gratidão a levou a querer fazer algo pelo Reino de Deus (lembre-se, a Palavra reiteradamente nos ensina que servir as pessoas é servir a Deus).

Portanto, toda vez que convidamos Jesus a entrar em nossas vidas duas coisas são imediatamente plantadas em nós: a salvação, cujo fruto será viver eternamente com Deus, e um chamado, cujos frutos Deus nos deu o privilégio de colher aqui, em vida.

No entanto, com o passar do tempo, muitos de nós, embora não percamos a salvação, temos o nosso chamado sufocado. Certa vez Jesus contou uma parábola em que compara a Palavra que foi plantada em nós a uma semente, e os nossos corações ao lugar em que essas sementes foram plantadas. As pessoas que ouvem a mensagem do Reino mas não a entendem são como as sementes que foram semeadas na beira do caminho, o Diabo vem e rouba o que foi semeado. A parábola também diz que as sementes que são semeadas onde há muitas pedras são as pessoas que ouvem a mensagem e a aceitam com alegria, mas duram pouco porque não tem raiz. Todas essas sementes tratadas até aqui acabam morrendo, isto é, essas pessoas acabam perdendo a fé. Mas é interessante que Jesus fala de uma outra semente, que apesar de também se encontrar em condições desfavoráveis, não chega a morrer, mas ela não pode produzir frutos. Isso me leva a pensar que era a respeito de muitos de nós Jesus estava falando. Essa terceira semente é aquela que é plantada em meio aos espinhos, representa aqueles que ouvem a mensagem, mas a preocupação deste mundo e a ilusão das riquezas a sufocam, e essas pessoas não podem produzir frutos.


Vivemos em tempos em que o homem nunca idolatrou tanto a si mesmo, nos colocamos como fim último e centro de tudo. Isso significa que cada segundo que vivemos nesse mundo é voltado para que conquistemos empregos, cargos, prestígio, ou quaisquer outras coisas que de algum modo nos façam mais realizados. O problema disso tudo está no fato de que vivemos em um mundo de recursos limitados, isto é, nem todos os seres humanos alcançarão tudo que ao menos utopicamente desejam. A razão é óbvia, os recursos são finitos. Em tempos de crise, os recursos são não apenas finitos, mas escassos. O que tem gerado preocupação e medo do futuro para a grande maioria da população. Eis aí o ambiente perfeito para o surgimento dos espinhos que sufocam a mensagem, e nos impedem de produzir os frutos, de viver inteira e plenamente tudo o que fomos chamados por Deus pra fazer e ser.
Mas felizmente essa parábola contada por Jesus ainda nos fala de uma quarta semente, aquela que é plantada em terra fértil, e que produz trinta, sessenta e cem vezes mais do que foi semeado. Talvez você ame profundamente a Deus, talvez você o tema e busque viver uma vida correta diante Dele, talvez um dia você até já tenha produzido frutos para o seu Reino, mas as preocupações desse mundo te fizeram estagnar. Talvez o seu casamento, ou os seus filhos, talvez o seu trabalho, ou os seus estudos, talvez os seus sonhos tenham feito você se perder dos sonhos de Deus. Sabe, nem sempre o que nos afasta de Deus ou dos sonhos Dele para nós são coisas que o desagradam, na verdade, eu tenho aprendido que os meus planos, por mais legítimos que sejam, tem o poder de me distanciar mais dos planos de Deus até que os meus próprios pecados. Isso porque quando eu peco eu posso perceber com mais facilidade que estou indo em rumo contrário à vontade de Deus, mas quando eu me torno obstinada a conquistar algo, sempre vai parecer que Ele está naquilo que eu estou decidida a fazer.

Mas é possível perceber quando o nosso chamado está sendo sufocado pelos espinhos. Sabe aquele desejo intenso de tentar retribuir o que Deus fez por você servindo-O? Ele já não é mais tão intenso. Sabe aquelas promessas que antes queimavam dentro de você? Elas se tornam apenas lembranças de um passado apaixonado pelo Evangelho. E sabe aqueles planos e sonhos que incluíam o seu chamado, o seu ministério, no seu futuro? São substituídos por projetos que só incluem você. E o problema de olhar para os meus planos somente é que quando eu olho pra mim eu tiro os olhos de Deus, e quando eu tiro os olhos de Deus eu me exponho a todas as inconstâncias desse mundo, me torno vulnerável diante das crises, das perdas, das frustrações. É quando os espinhos vêm, e sufocam o meu coração, e param o meu chamado.

Mas se o meu coração é uma terra fértil, isto é, livre dos espinhos das preocupações, mesmo que os tempos difíceis cheguem, mesmo que as perdas me alcancem, mesmo que o futuro pareça incerto, e mesmo que eu me sinta entediada e os dias pareçam sempre iguais, ainda assim, eu posso me agarrar na fé de que a semente que foi plantada em algum momento irá dar frutos. E que no fim das contas, a realização vem ao concretizar os sonhos Dele, e não os meus.